Realizadores da animação baiana apostam na TV

10/09/2010
Realizadores de séries de desenho animado apostam em canais fechados de televisão. Governo federal planeja incremento de 10% na cultura digital Em cinco anos, o governo federal pretende aumentar de 5% para 10% o peso das atividades culturais. Um dos segmentos que deverão receber incentivos é o da geração de conteúdos digitais para a televisão, especialmente a animação. “Temos tudo para ser um dos maiores pólos exportadores de desenhos animados do mundo”, acredita o ministro da Cultura, Juca Ferreira. O MinC estimula a parceria de produtores com canais de TV por assinatura. Na Bahia, o Irdeb – Instituto de Radiodifusão da Bahia – está afinado com a proposta de incentivo aos realizadores de desenho animado e desenvolve o edital Apoio à Produção de Projeto Completo para Série de Animação e Interprograma de TV, pelo Fundo de Cultura, da Secretaria da Cultura do Estado da Bahia. Com recursos de R$50 mil para cada projeto selecionado, até o fim de dezembro serão projetadas cinco séries baianas. Tio Mussarela (Cláudio Guido), Ninguém – O Herói do Povo (Augusto Matos), Tadinha (Maria Luiza Barros), A Bruxinha Lili (Hugo Dourado) e A Mata Animada (José Vieira) são os projetos vencedores do edital. INICIATIVAS NACIONAIS “Animação é arte coletiva. É importante que o mercado de animação esteja sendo fomentado, neste momento em que a televisão fechada demonstra estar aberta às produções do gênero”, considera o animador Ducca Rios, citando iniciativas de autores nacionais que estão na grade do Discovery Kids, como Peixonautas, Meu Amigãozão e Princezinhas do Mar. “A série feita para televisão possibilita o licenciamento de produtos, além de ser muito importante para formação de público simpático ao conteúdo nacional”, considera a produtora Maria Luiza Barros, que vai desenvolver os projetos Tadinha e A Bruxinha Lili, selecionados pelo edital do Fundo de Cultura. Mas, mesmo considerando ser algo relativamente recente, especificamente no mercado de séries ainda não há um baiano da gema atuando com vigor. Por outro lado, um dos pioneiros do gênero animação no Brasil, o artista plástico baiano Chico Liberato está desenvolvendo o longa-metragem Ritos de Passagem, com recursos de R$1,2 milhão do Fundo de Cultura, Secult. MERCADO INTERNACIONAL Cartunista desde 1989, Augusto Matos enxerga a oportunidade dos editais do governo e de demais órgãos apoiadores das iniciativas relacionadas  à produção de filmes de animação no Estado da Bahia, como  pioneiras em termos de política cultural. “Está ocorrendo uma mudança no mundo das artes, a modernização das linguagens e a emergência de preservarmos o que temos de mais precioso, incluindo aí o nosso patrimônio tangível e intangível”, raciocina. José Vieira diz que sempre foi cartunista e “é claro que do cartoom pode-se passar facilmente para a área de animação. Mas penso que não se deve deixar de pensar no regional, mas atingir o mercado internacional”. Ele cita o filme A viagem de Chihiro, impregnado pela cultura japonesa e pelo xintoísmo, como um exemplo de que o autor de animação não deve deixar de tratar de valores e questões de sua terra. COMERCIALIZAÇÃO Cláudio Guido conta que pretende experimentar o mercado profissional da animação. “A gente fica meio ansioso, o que é natural de artista, por querer sentar e produzir logo as animações. Mas é preciso criar uma cultura de trabalhar as coisas na ordem correta, de desenvolver primeiro roteiros e argumentos bem realizados, revisados, adequados à faixa etária”, contabiliza, já pensando em utilizar o fruto deste trabalho para fazer contatos com produtores.  “Imagino que com este planejamento feito, será mais fácil vender o projeto e realizar a série”, avalia Guido. Diretor do Irdeb, Pola Ribeiro endossa a importância de se estruturar a animação baiana, para dar bases para a estruturação individual. “É uma atividade que exercita a paciência, reflexão crítica sobre cada plano que vai fazer, cada conhecimento que vai ser aplicado”, exemplifica. BÍBLIA Cada um dos projetos selecionados recebe o valor de até R$50 mil, totalizando R$250 mil, para fase de elaboração de personagens, projeto executivo, sinopses, roteiros e a produção de um interprograma de TV com 1 minuto e meio de duração, que será exibido na TV Educativa e servirá também para demonstrar como será a personalidade de cada uma das séries desenvolvidas, algo fundamental para conseguir parceiros e co-produtores para o desenvolvimento da série completa. As propostas selecionadas recebem apoio para elaboração de projetos inéditos e originais de séries de animação (conhecidos como “bíblias”), compostos por treze episódios de treze minutos de duração cada, além da produção de um interprograma de televisão com um minuto e trinta segundos de duração, sobre a série proposta. O diretor do Irdeb, Pola Ribeiro, fala do interesse governamental para que a cadeia produtiva do audiovisual seja pensada no sentido de produção e distribuição, pois “existe uma demanda pela animação independente”. Na última semana de agosto ele participou do Seminário Curta & Mercado, realizado em São Paulo, atento às oportunidades para o crescimento do segmento, no estado da Bahia. “O que motivou o lançamento deste edital foi uma sinalização que a própria categoria de animação nos deu, com a inscrição de mais de 25 projetos baianos no Anima TV, em 2009”, detalha Sofia Federico, à frente da Diretoria de Audiovisual – DIMAS. “O movimento dos criadores no estado se mostrou preparado, pois escrever projetos para série de animação é algo muito específico”, conclui. PROJETOS SELECIONADOS
  • Tadinha (proponente: Maria Luiza Barros)
Tadinha, proposto por Maria Luiza Barros, é uma comédia sarcástica de conflitos familiares, que utiliza da espontaneidade natural das crianças para revelar a hipocrisia social a partir de situações vividas no cotidiano. Ela permite exageros e piadas non sense e sua principal personagem é uma criança de 6 anos, que desconcerta os adultos à sua volta pela sua extrema espontaneidade. Posta da castigo, escapa por um portal para um mundo surreal. A personagem criada por Ana Claudia Caldas tem concepção visual de Ducca Rios. Os roteiros dos episódios serão desenvolvidos por Ana Claudia Caldas e Ducca Rios.
  • A Bruxinha Lili (proponente: Hugo Dourado)
Criada pela escritora Catarina Andrade e o artista plástico Ducca Rios, a história original de A Bruxinha Lili chegou a ser produzida na forma de curta-metragem, com duração de 5 minutos, após ter sido aprovado no Fazcultura e selecionado no Programa Oi Futuro de Patrocínios Culturais 2007. Na ocasião o trabalho foi dirigido por Leonardo Copello. A personagem A Bruxinha Lili tem direção de arte voltada para visual “mágico”, que reproduz tecnologicamente o estilo de pintura aquarelada. A série A Bruxinha Lili tem como proponente Hugo Dourado, que produziu junto com Maria Luiza Barros o curta metragem original da história, além de inúmeros outros trabalhos para a área cultural. Músico, designer e artista plástico, Ducca assinou o roteiro, a concepção visual, a co-autoria e a assistência de direção do desenho animado A Bruxinha Lili, premiado com o Galgo Alado, do Festival de Cinema de Animação de Gramado 2008. O curta integrou em seguida uma mostra de filmes infantis nacionais, levada para o famoso estúdio DreamWorks, em Los Angeles, onde foram produzidos filmes como Shrek.
  • Ninguém, o Herói do Povo (proponente: Augusto Matos)
Augusto cresceu lendo nomes do quadrinho nacional, como Ziraldo, Maurício de Souza, Flávio Colin, Shimamoto, entre outros, além de artistas norte-americanos de herói clássico, caso de Will Eisner, Frank Miller, Kirby. Mais tarde, assume influências do "quadrinho de autor" europeu (Moebius, Crepax, Tamburini, Pazienza, Gaza) e nipônico (Koike, Otomo, Tesuka). O autor fez cartuns e ilustrações para o Jornal da Bahia e, em 1990, concebeu o personagem Ninguém, publicado em revistas alternativas e em São Paulo, numa publicação coletiva, Facção. Em 2007 desenvolveu uma animação com o personagem, com o patrocínio da Olhar Filmes. Ninguém é o jovem Everaldo, (anti) herói que luta capoeira e boxe e foi abandonado ainda bebê num container de lixo, sendo encontrado pelo veterano herói "Carcará" em meio a sua perseguição a um bandido. Treinado pelo Carcará, o jovem Everaldo torna-se Ninguém, o vigilante soteropolitano, o herói  da selva de pedra, o homem que não toma sopa de letras pra não comer H.
  • Tio Mussarela, direção de Cláudio Guido Silva Cardoso
Cláudio Guido trabalha com animação há uma década e desenvolve, com Daniel Sínola, um projeto para internet voltado para quadrinhos. A partir de 2005 começou a aplicar a técnica do desenho animado para trabalhos na área de publicidade. Em 2008 realizou o primeiro curta, A Morte de Férias, exibido no Festival 5 Minutos, de Salvador. No começo de 2009, o autor inscreveu o projeto Tio Mussarela no Anima TV. Continuou desenvolvendo a proposta e participou, pelo Estúdio Liberato, da feira Kids Scream, direcionada ao conteúdo de televisão infanto-juvenil. Contemplada em edital, Tio Mussarela é uma série voltada para o público juvenil, pré-adolescente, e desenvolvida com bom humor. O foco é um velhinho atrapalhado, entregador de pizza de uma cidade fictícia. Seu ajudante é um rapaz meticuloso. A técnica para dar vida a estes e outros tipos é o desenho direto no computador em traços pesquisados pelo autor em referência fotográficas.
  • Mata Animada, direção de José Vieira de Vasconcelos Neto
Cartunista contemporâneo de Lage e Nildão, José Vieira é também arquiteto e foi nesta função que começou a experimentar a animação em 3D. Neste formato filmou, em 2008, Prisioneiro na torre, curta em animação, 35 mm, vencedor do Prêmio Braskem Cultura e Arte - Categoria Cinema. A aventura, voltada ao público juvenil e adulto, é ambientada no final do século 18 e foca no tema escravidão. Em Mata Animada o autor vai usar a tecnologia de animação em 2D, valorizando seu traço e atendendo ao público mais jovem a que se propõe a série e ao estilo bem humorado, mais ágil. A trama é uma idéia antiga de José Vieira, que vinha tentando participar de editais mas confessa que não soube lidar com pedidos burocráticos. Selecionado, o projeto foca o tema ambientalista, alavancado por personagens bem brasileiros, como o Saci e a Caipora.